sexta-feira, 21 de maio de 2010

De volta ao início, de novo.

“Quando se anda em círculos, nunca se é bastante rápido.” O último verso de “Filmes de Guerra, Canções de Amor”, última música do segundo álbum dos Engenheiros do Hawaii, provavelmente remete a mais uma das muitas viagens proto-existencialistas de seu líder e letrista Humberto Gessinger nos anos oitenta. Mas, mais que isso, reflete um aspecto inerente à cultura pop de nosso país. Nós, fãs de música, veículos independentes, mídia especializada (...) ou a industria do entretenimento pura e simplesmente; estamos sempre atrás de bandas novas, músicas novas, enfim, queremos coisas novas sempre. Queremos aquela sensação de descoberta, de encontrar uma banda que quase ninguém conhece, enfim. Mas já parou pra pensar que estamos sempre voltando pro mesmo lugar?

O ‘estalo’, por assim dizer, não é novidade. A discussão é velha, mas em tempos de internet e seus fenômenos – como os novatos Hori, Restart, Cine e coisas do tipo – soa engraçado que ainda queiramos ficar presos a velhos ícones e donos da razão. Não estou dizendo que o filho do Fábio Jr. e seus congêneres sejam a salvação de coisa alguma, ou mesmo que talvez possam ter alguma coisa interessante pra dizer ou acrescentar a qualquer discussão, por mais banal que seja. Só que o fato de produtos como estes atingirem um nível tão grande de aceitação entre o público adolescente é a prova de que é possível buscar outros caminhos para o mercado musical (independente ou não).

Ok, dando nome aos bois: O assunto me veio à cabeça depois de uma ‘passada de olho’ por um caderno cultural de um grande jornal daqui do Rio. Capa e parte da contra capa eram dedicadas ao novo álbum de Gilberto Gil. Logo a baixo (na mesma contra capa) uma carta em resposta a uma matéria redigida por Caetano Veloso uma semana antes. Ou seja, sempre os mesmos. Sempre aquela velha mania de ir perguntar ao Caetano ou ao ex-Ministro da Cultura o que eles pensam a respeito de qualquer coisa que o valha. Quando eles lançam disco novo então... Mesmo que sejam tão somente repetições maçantes fruto de carreiras estagnadas (mas nem vou entrar no mérito da questão). Fato é: Estamos sempre dando voltas e retornando ao mesmo lugar.

Os ícones (...) citados aí em cima fazem parte do cenário musical e cultural de nosso país desde o final dos anos sessenta. De lá pra cá tivemos uma penca de bons nomes com muita coisa pra dizer nos anos oitenta, e até nos noventa, por incrível que pareça. Renato Russo, por exemplo. Tinha opiniões bem definidas a respeito dos mais diversos assuntos e sabia se expressar e comunicar essas opiniões ao público jovem. Mas não aceitou o rótulo de representante de nada, nem de ‘educador via satélite’. A Plebe Rude era outro exemplo de banda com integrantes esclarecidos e com opiniões interessantes (vide sua letras). Os anos oitenta passaram, os noventa também. E eis que, em pleno 2010, ainda precisamos recorrer a dupla Gil & Caetano para termos nossa ‘sede de cultura’ saciada. Ou mesmo para obtermos respostas para assuntos dos quais sabemos muito pouco (e, às vezes, eles também).

Musicalmente a coisa é bastante parecida. Sempre voltamos ao mesmo lugar. Ao pop, ao assimilável, ao fácil ou banal. No início dos anos 2000 tínhamos um cenário independente interessante e, até, promissor em alguns aspectos. Boas bandas tanto de hardcore, emocore (não confundir com o que está aí hoje) e de música extrema (usando qualquer rótulo que o valha). O tempo passou, fomos surpreendidos por uma onda de ‘profissionalismo’ que transformou todo mundo em artista, ícone, enfim. Era a internet com suas milhões de possibilidades. Havia público pra todo mundo e pra ninguém, ao mesmo tempo. Mas era preciso o aval da mídia de massa, que preferiu ficar na dela e ver no que ia dar. Resultado? De volta ao pop, ao inofensivo. De volta ao NxZero, ao Fresno. Me refiro ao formato, não aos nomes de uma forma específica, ok? Aliás, as duas já vinham de uma outra época. Lá de trás, bem no comecinho do tal emocore por essas terras (trazido pra cá por Dance of Days e sua turma). Nada muito diferente do que acontecia nos, aqui citados, anos oitenta. Enquanto Legião e Plebe Rude invadiam as paradas de sucessos uma penca de bandas Punk fazia barulho nos porões do Rock nacional. A senhora Grande Mídia até flertou com o estilo, pinçando esse ou aquele nome. Os Inocentes são um exemplo disso. Vieram do reduto Punk, foram pinçados e expostos. O resultado? Quem vendia mesmo eram nomes como Blitz, Radio Taxi e outros de hits inofensivos. Voltávamos, mais uma vez, ao mesmo lugar. Voltávamos à inocência da Jovem Guarda e de Celly Campello, primeira geração genuinamente ‘roqueira’ que tivemos por essas terras.

Soa penoso, maçante, estúpido. Abrimos o jornal e damos de cara com mais uma entrevista altamente esclarecedora do ex-Ministro da Cultura, ou com mais uma matéria assinada por Caetano Veloso. Vamos a um festival de bandas independentes e damos de cara com uma garotada se revezando em um palco em busca da fama, de um lugar ao sol (ou na Garagem do Faustão), ignorando todos as possibilidades que um mercado independente viável e auto-sustentável, como o da virada dos 90 para os 2000, nos oferecia. Voltamos a sonhar com espaço em redes de televisão? Voltamos aos anos oitenta? Com uma penca de bandas e poucos veículos para mostrá-las? Voltamos a oferta maior que a procura? Enfim, voltamos ao início, de novo.

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Detalhe interessante? No mesmo caderno de cultura ao qual me referi, havia uma resenha do show de um tal Chuck Berry no Rio. Nada de mais, certo? Só um dos inventores desse tal de Rock’ n Roll tocando com um som horrível e pra uma casa vazia. Ou seja, quando é pra olhar pra trás por um bom motivo, fingimos preferir olhar pra frente. Vai entender...


Rafael A.